A vida é uma cereja. A morte um caroço. O amor uma cerejeira.


12 de novembro de 2006

Viver a Escola...

A Escola era como um pequeno país, com pessoas simpáticas e antipáticas, pacientes e impacientes, generosas e egoístas, bendizentes e maldizentes, que trabalhavam juntas e juntas se construíam e desgastavam.
Disse que a Escola era como um país.
E era.
Tinha regras que se cumpriam e outras que não se cumpriam.
Tinha governantes que eram eleitos democraticamente e governavam.
Tinha governantes que, democraticamente, exerciam o seu direito de pôr, opor e dispor, conforme a influência dos seus líderes ou sensibilidades.
Possuía as zonas distintas dos grupos, as pequenas capelas da oposição, os círculos presidencialistas e as largas faixas dos neutros.
Em resumo: tinha um corpo docente de uma centena de indivíduos, exercendo uma das profissões mais gratificantes e esgotantes do mundo.
Por isso, quem tenha a triste ideia de pensar que levar uma escola para a frente é tarefa fácil, é porque conhece muito pouco da natureza humana e das suas fraquezas!
Fazer com que, dia após dia, uma população de, aproximadamente, mil almas, conviva em paz e sossego, recebendo cada um o que lhe é devido, desde comida a respeito, é uma tarefa que requer, por vezes, virtudes gigantes que não possuímos.
Porque numa escola acontece de tudo.
Uma escola não é um edifício com muitas salas onde os meninos entram a toque de campainha, recebem ensinamentos e tornam a sair.
Para começar, as campainhas, de vez em quando, não tocam e então, gera-se um crescendo de gritos e assobios que, ao rolar pelos corredores, leva às portas da loucura os mais nervosos.
Uma escola faz-se todos os dias com muita Bondade e Firmeza.
Fazem-na todos os que nela trabalham.
Sem nenhuma excepção.
E quando alguém falha (e todos os dias falham sempre alguns), as faltas vêm ao de cima como nódoas de azeite e ficam à vista de quem sabe entender.
O pior é que, uma vez toleradas, se pensam aceites e se instalam de vez.
Depois, como um vício, só são extirpadas com lutas penosas e o sofrimento daqueles que atacam e de quem se defende.
E nem toda a gente, devemos sabê-lo, nasceu campeã de causas perdidas!

Uma escola é também um lugar onde é preciso saber, e depressa, o que se faz quando:
se partem braços
se tomam drogas
se roubam objectos
se cortam veias
se atropelam alunos
se instauram processos
se anavalham rivais
se apalpam garotas.
É o lugar onde os encarregados de educação vêm:
desabafar
perguntar
pedir
exigir
gritar
ofender
ameaçar...
e, por vezes, bater!
É o sítio onde mães de famílias respeitadas são desrespeitadas até à neurose, à raiva e ao pranto, só porque não possuem as doses exactas de autoridade e ternura que despertam respeito nesta seiva a ferver.
Uma escola é também um lugar cheio de explosões de sons agressivos, onde as dores de cabeça serão enxaquecas, os aborrecimentos se transformam em depressões e as depressões em psicoses.
Ah!, mas é também um lugar maravilhoso, onde os olhos de uma criança, de repente, se acendem e aquecem quem vê.
É o lugar onde as lágrimas podem ocultar uma imensa alegria e um sorriso tenso, um drama sombrio.
É o país do Ontem, do Hoje e do Amanhã, onde os professores apelam incessantemente às fontes da paciência, em nome dos meninos que eles foram, e onde semeiam, sem saber se o joio vencerá o trigo ou se a colheita será farta ou não.
É o reino dos Poetas, dos Homens-Meninos e daqueles que ouvem, no centro da alma, o que diz o silêncio da criança que olha.
É um país, sim, e um país singular, porque aí se exercem, a todas as horas, persistentemente, o Amor e a Paz.
E isso é difícil: não nascemos anjos.
(Maria Lucília Bonacho - O Futuro está a estudar)

1 comentário:

Anónimo disse...

Goatei! São certamente palavras de quem vive ou viveu a escola. Como seria bom se aquela que se considera Ministra da Educação conhecesse por dentro o país-escola.Como seria bom que as medidas necessárias para mudar o que está mal ou menos bem ,fossem mesmo pensadas por essa razão e não apenas produdos economicistas e divulgação de falsas verdades sobre quem todos os dias e a todas as horas (sim ,que professor não trabalha apenas 35)se esforça. A desilução caiu como um manto negro sobre a vontade de melhorar ,de evoluir, de fazer... agora são muitas as vozes que perguntam PARA QUÊ?